Monday, September 8, 2014

Ẹ mo ri O!

O texto que segue é dedicado ao Professor Dr. e Acadêmico Ogán Ordep Serra e a minha querida Ekedji Cinha e ao meu tio Arnaldo Silva, da Escola de Samba Filhos do Tororó.
Ekedji,Ago mo juba Egbon mi Ki Ọlọ́run Fe̟ O
“ emoriô deve ser
uma palavra nagô
uma palavra de amor
um paladar... emoriô deve ser

alguma coisa de lá
o Sol, a Lua, o céu
pra Oxalá...” Compositor: João Donato (música) Gilberto Gil (letra)

Acho que todos na Bahia já ouviram essa música gravada.

Que delícia o som dessa música, não é?!  

Os dois motivos principais para esse artigo foram:
1) o programa “Saraus” da Globo News, no qual o Jornalista Chico Pinheiro se delicia e nos delicia com boa música, através de seus convidados maravilhosos e
2) A posse do (meu amigo e irmão em Xangô) Antropólogo Cachoeirano Ordep Serra, na cadeira 27 da Academia de Letras da Bahia (ALB) nessa quinta-feira próxima passada dia 4 de setembro, para ocupar a vaga deixada por James Amado. Vale lembrar que Serra também é escritor, premiado duas vezes com um livro de contos, pela própria ALB, além de ser especialista em cultura grega e maior defensor da nossa (dele também) Cultura Jeje-Bantu-Nago- Ameríndia.
Quando assisti ao programa da série “Saraus” no qual o convidado era ninguém menos que o João Donato, eu, finalmente atentei para a autoria da música “Emorio”, vez que eu só enxergava o nome de Gilberto Gil associado a esta delicia sonora. Em especial quero destacar o batuque bem nosso que o Robertinho Silva fez na bateria juntando tambores e agogô naquela oportunidade... que maravilha!. Transportei-me a oportunidade que tive de dançar Ijexá no Aconchego da Zuzú com a própria Mãe Zuzú, já com mais de 100 anos de idade, há alguns anos.
Mas a história não começou aí. Eu era criança no bairro do Tororó, sobrinho de Arnaldo Silva, filho de Conceição, irmã mais velha dele (hoje no Ọrun), e costumava aguardar, como todos no bairro, com ansiedade, a visita dos Filhos de Gandhi, que acontecia, na terça-feira de Carnaval, constituindo assim um clímax do festejo, ao lado da saída da Escola de Samba Filhos do Tororó.
É preciso colocar o processo de assimilação da cultura Iorubá-Nagô no recorte delineado pela cultura eurocêntrica imposta ao povo brasileiro e baiano pelas elites de poder desde a epopéia do “descobrimento”, passando pelas “Entradas e Bandeiras” e pela “Casa Grande e Senzala” de Gilberto Freire. Esse recorte cruel foi muito bem assimilado pela massa popular da Bahia dos idos de 30,40 e 50, época florescente do projeto eugenista da sociedade brasileira, que via no “branqueamento” do povo a “solução” para “os problemas” do Brasil. Com todo o respeito que merece um Gilberto Gil e um João Donato, peço licença para depor com conhecimento de causa sobre os fatores que nos distanciam da Cultura Iorubá-Nagô, legado tão rico que traz estudiosos de todas as partes do mundo interessados nos sues detalhes que só permaneceram aqui por terem sido preservados com obstinação pelos Templos Religiosos de Matriz Africana.
Na minha casa, (preciso enfatizar que minha casa era uma casa de gente preta?) o que era defendido de forma tácita e implícita, e explicita (quando tal face da educação se tornava de exposição necessária) era a adoção do modelo etnocêntrico europeizante. A esperança era de que os filhos tivessem o “bom senso” de “limpar a família”. Minha mãe foi criada por uma família de mulatos de pele clara que ascenderam à classe média. Daí, o leitor pode fazer a sua leitura.  
Gente, o processo de discussão sobre a diversidade étnico-racial que vem ocorrendo em todo o mundo, tem se dado também no Brasil em vários setores da sociedade. Entretanto, não há uma discussão efetiva em torno do cerne da verdade, e sem a verdade toda a discussão se torna cosmética e será substituída pela próxima moda. O resgate histórico da situação do afro-religioso, desde os diversos momentos incluindo o momento no qual foi interditado por força de  lei, a qual só cessou na década de 70 com o Governador Roberto Santos, precisa ser discutido de forma sincera e corajosa para garantir,de vez, ao povo, o direito ao livre exercício de sua religiosidade, ao exercício escolar da História do Negro , e o acesso das comunidades vulneráveis (muito mais numerosas,do que reflete a vã estatística do Estado) à escolaridade e a outros bens e serviços que refletem no nível de desequilíbrio e da violência.
Quanto à “palavra Emoriô”, não é uma palavra e sim uma frase, que em Iorubá se escreve como mo ri O” e significa “Eu Te vejo”. No caso o “O” maiúsculo é que enfatiza referencia a um Ser Superior, digno de Reverencia, daí a associação a Oxalá, ou em Iorubá Òris̟a ni ńlá”, que significa “Guardião que está no alto”, ou “Orixalá”, ou como pronunciamos na nossa Bahia, OXALÁ.

Referencias:

1.      Emoriô http://www.vagalume.com.br/joao-donato/emorio.html (acessado em 08/09/14);
2.      FERNADES, Gláucio da Gama. SILVA, Arlete Oliveira da Conceição Anchieta da. LIBERDADE RELIGIOSA NOS CULTOS AFRO-BRASILEIROS: UM ESTUDO NA CIDADE DE MANAUS – AMAZONAS. http://www.xiconlab.eventos.dype.com.br/resources/anais/3/1308348266_ARQUIVO_LiberdadeReligiosanosCultosAfro-brasileiros-CONLAB.pdf  acessado em 08/09/14;
3.      O antropólogo Ordep Serra é eleito para a Academia de Letras da Bahia http://www.metro1.com.br/antropologo-ordep-serra-e-eleito-para-a-academia-de-letras-da-bahia-6-47331,noticia.html (acessado em 08/09/14);


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